Pessoas estranhas #98 - as pessoas no cinema

by - terça-feira, abril 24, 2018

Ultimamente, ir ao cinema tem sido um martírio. As pessoas deixam a educação em casa (se é que alguma vez tiveram) e comportam-se como selvagens, num local onde supostamente o maior interesse está no que se passa no ecrã.

Apenas supostamente. Na minha última ida, há uns dias, fui ver um filme de terror. A sala estava apinhada de adolescentes. Ver um filme em silêncio pelos vistos é coisa do passado. Devo ser muito velha para compreender, mas as meninas estavam mais preocupadas em sentar-se ao pé do rapaz mais giro e discutiam em alta voz quem iria ficar ao lado dele. Durante o filme, chamavam a sua atenção com comentários inoportunos e risinhos. Outros, gozavam uns com outros por terem apanhado um susto em certa cena. Outros adivinhavam em voz alta quem iria morrer a seguir. Os "shius" e pedidos de silêncio aconteceram durante todo o filme, e houve quem fosse chamar o pessoal do cinema, mas em vão. Os pirralhos de merda de hoje em dia fazem de um evento outrora cultural um acontecimento social onde vale tudo, inclusivé deixar o espaço TODO cagado. E o pior era que um dos paizinhos estava presente, e era como se fosse um cadáver, ignorando os pedidos de silêncio dos outros adultos, provavelmente contente por simplesmente não estar a ouvir a esposa.

Na ida anterior, os adolescentes irritantes também estavam presentes mas em menor número e por isso foi mais fácil controlá-los. Mas tivemos o desprazer de ter, ao nosso lado, um casal que se foi abastecer ao Jumbo. Já é irritante ter alguém a comer pipocas ao lado, mas eventualmente as pipocas acabam e o silêncio repõe-se. O abastecido casal tinha não só as pipocas do Jumbo, mas também nachos, batatas fritas, frutos secos, pacotinhos de sumo, e mais, que nunca pararam de resmalhar durante todo o santo filme. Sacos a abrir, sacos a serem amachucados, lixo a ser armazenado em sacos de plástico, em repeat. Sim, no intervalo mudámos de lugar, e mesmo assim ao longe ainda se ouvia o resmalho.

Há uns tempos fui ao cinema e um homem ria-se como se lhe tivessem a fazer cócegas nos pés enquanto lhe arrancavam as unhas com um alicate. Não era uma comédia. Noutra ocasião, um homem entreteve-se a dobrar e a desdobrar um saco de plástico vazio. Noutra vez ainda, um homem gordo e grande passou o tempo a imitar sons de explosões e a proferir uns "BOOM!", "JÁ FOSTES", "TOMA LÁ QUE JÁ ALMOÇASTES", e para além do incómodo sonoro ainda levei com pontapés no português. Uma vez em que fui ver um filme de animação, em versão original, um burro de um pai levou a filha pequena que não parava de perguntar: "O que é que ele está a dizer agora?", "O que está a acontecer?". Também mudei de lugar ao intervalo.

Já não se consegue ir ao cinema e desfrutar de um filme normalmente. Não há prazer quando o espaço que é de todos é profanado, nem que seja por um só asno. Se o respeito é raro em todas as circunstâncias, no cinema e noutros locais a tendência é seguida. Os espaços de cultura e lazer são vítimas dos tempos em que a partilha, o dizer "estou aqui", "faço coisas", "olhem para mim", e as hashtags são mais importantes do que desfrutar do momento. Um minuto de silêncio pelas pessoas que não conseguem olhar para além do umbigo e do ecrã do telemóvel.

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4 comentários

  1. Pensava que éramos só nós, mais velhotes, que tais acontecimentos incomodavam. Vejo que não! Salvam-se as salas da Cinemateca, mas até aí eu já tive que fazer um shiu a umas moçoilas novaças em pleno "Feiticeiro de Oz", e que incomodadas ficaram! Deixámos praticamente de ir aos cinemas pelo preço, mas também (e muito mais) pelo desassossego!

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    1. Não tenho uma diferença assim tão enorme desta geração barulhenta e fico completamente chocada com o desrespeito. Nunca me comportei assim naquela idade, e não sei o que lhes passa na cabeça para acharem que podem fazer o que quiserem num espaço que partilham com várias pessoas e cujo interesse está no ecrã. E não é apenas um problema dos mais jovens... Enfim, é triste.

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  2. Uma realidade!!! Outra coisa que me irrita é aquela malta que insiste em ir ao fundo do pacote das pipocas, remexendo violentamente as ditas como se tivessem a fazer uma escavação ao centro da Terra. Comam as de cima... Por favor!

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