O último testamento de Leonard Cohen

by - terça-feira, novembro 15, 2016


O último álbum de Leonard Cohen, que saiu apenas umas semanas antes da sua morte, é extraordinário. Para mim, um dos melhores. Raios partam este hábito recente dos artistas fazerem coisas abismais antes de partirem para o outro lado. Mal dá tempo de digerir as coisas sem o peso escuro da morte. "You Want It Darker" já é escuro o suficiente sem essa premissa.

Já o tinha ouvido vezes suficientes para poder opinar, mas a morte deu-lhe um toque diferente e cá estou eu a ouvir em loop, novamente, com uma percepção diferente das coisas. Talvez seja apenas a nostalgia e a saudade a atacar, mas quanto mais ouço mais gosto. A minha preferida é a que dá nome ao álbum e que lhe dá início e é um pedaço de céu. Não só por Leonard andar por lá nestes dias, mas porque tem um ritmo marcante, uma letra tocante e umas back-vocals que parecem anjos durante todo o tema. É o mote para o resto do álbum, no mesmo registo - mensagens poderosas, um compasso mais forte que o do coração e vozes de fazer de arrepiar a espinha. É o retornar às origens, onde o básico e o descomplicado dão origem a emoções complexas.

Já para não falar da voz do Leonard, obviamente, saída, sempre, dos confins de uma gruta cheia de uma luz calmante, positiva e negra ao mesmo tempo. É incrível esta clareza musical a que chegou aos 82 anos. Mais vivesse, e melhor faria. Teve o dom da palavra e da musicalidade até ao fim, e é um privilégio ouvi-lo, agora, há 50 anos, e daqui a 50 anos.

Temos várias mensagens que soam a despedida ao longo do álbum, como “I’m leaving the table/I’m outta the game” em Leaving the Table ou “I’m ready my Lord”, afirma em "You Want It Darker". Mas há também mensagens ao amor perdido ou à espitualidade. Leonard não fez nada ao acaso durante toda a vida, e este álbum não foi a excepção.

É místico, de uma arrepiante calma melódica. O último, fatalista e enigmático testamento. Ouçam, se fizerem o favor.

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