Desde março que estava em teletrabalho. Foi uma adaptação difícil. De um edifício que alberga milhares de pessoas, passei a trabalhar com três gatos em casa. As salas de reunião passaram a ser virtuais. O meu monitor gigante desapareceu, assim como a cadeira e secretárias apropriadas para trabalhar. Surgiram dores de cabeça, de costas, de pulso, ombros. A rotina mudou, completamente. Mas tudo foi ultrapassado, fruto do hábito e de algumas adaptações.

Trabalhar em casa fez com que alterasse os meus hábitos. Passei a fazer exercício às 07h, antes de começar a trabalhar. Passei a ler à hora de almoço. Depois do expediente, todos os dias fazia ioga e lia mais um pouco. Fazia nas calmas a comida para o dia seguinte. Umas festas aos gatos aqui e ali. Trabalhar confortavelmente de fato de treino. A música alta. Uns minutos de alongamentos ao longo do dia. O meu coração desacelerou, o stress diminuiu. A minha produtividade manteve-se igual, assim como o número de horas trabalhadas. Sentia que conseguia ter tempo para mim, que a minha vida não era só trabalho.

Na semana passada, voltei ao escritório. E foi péssimo. Só nos transportes, perco no mínimo 1h30 do meu dia. São 7h30 horas por semana que sinto que me são roubadas. Deixei de ter tempo para fazer ioga depois do trabalho. Deixei de ter tempo para planear as minhas refeições. Assim que chego, acelerada, acelerada continuo para preparar as coisas para o dia seguinte, para, adivinhem, ir trabalhar outra vez. A vida, que antes parecia ter uma pausa, que permitia tirar o pé do acelerador, voltou a ser um rodopio e parece que nunca desligo verdadeiramente da vida laboral.

Em plena pandemia, muitas são as empresas que optam por manter os trabalhadores afastados dos escritórios, mas infelizmente não é o caso da minha. Com um discurso que defende o regresso ao escritório devido aos estudos que dizem que o espírito de equipa diminui com o teletrabalho, e a anti-sociabilidade aumenta, mandaram-nos regressar. Guess what, eu já era anti-social antes. E agora, ao ver a fronha dos meus colegas novamente e ouvir as suas conversas frívolas, mais anti-social e raivosa fico.

E há regras no escritório, claro. Só se pode tirar a máscara no lugar à secretária, só nos podemos sentar lugar sim, lugar não, e as reuniões presenciais são desaconselhadas. Ou seja, estamos afastados na mesma e arriscamos a nossa saúde e a dos nossos só porque sim. Qual é a vantagem de estar no escritório, nestas condições? Para além do mais, não tinha alergias desde março... Chego ali e não páro de espirrar com aquele ar condicionado do pólo norte. Que saudades! 

Quando se trabalha necessitando apenas de um computador e ligação à internet, e depois de se experimentar o teletrabalho, fica difícil voltar a estas condições. Não há motivo nenhum para não desempenharmos o nosso trabalho onde quer que seja. Agora sei que podia trabalhar a partir de um monte alentejano, no meio da natureza, com qualidade de vida, e ainda assim ser produtiva e desempenhar o meu trabalho com toda a normalidade. O ambiente também agradeceria - seriam menos trabalhadores a deslocar-se, o que ajudaria também na menor circulação de pessoas necessária em tempos pandémicos. 

Uma hora e meia diária é-me roubada, e não estou nada feliz.